sexta-feira, 23 de setembro de 2011

A Revolução Interior | ReNata Batista


      Durante muito tempo eu costumava dizer que existem suas coisas que todo ser humano deve vivenciar na vida: uma delas é fazer teatro. Isso porque p teatro foi uma experiência transformadora para a minha existência.
   Só há pouco, (bem pouco tempo, pra ser mais exata há alguns dias) é que eu pensei: “peraí, quem disse que todo mundo precisa do teatro pra se revolucionar?”. E por aí vai o meu pensamento agora. Vem comigo no raciocínio:
   Eu era uma garota tímida e minha mãe dizia que eu deveria ser “mais simpática” com os outros - o meu jeito reservado devia ser uma agressão para o mundo! Fui buscando jeitos de me expressar e ser aceita. Lá pelos 12 anos, eu fiz uma peça de teatro na sala de aula e a professora de Português disse que eu era muito boa e deveria investir nisso. Aos 13 comecei a fazer teatro, conheci pessoas legais, me diverti muito, fui aceita por um grupo enorme de pessoas.
   Meus horizontes se ampliaram... foi incrível! Sendo oriunda de uma família que não tinha relação com a arte, eu não teria tido acesso a certos movimentos e meu mundo teria sido bem mais restrito sem o teatro, que me abriu as portas para a música, o cinema...
   E, tendo o histórico da “timidez”, essa experiência me transformou em algo que eu não conhecia (e que parecia bem melhor do que o que eu era antes, uma vez que não havia aprendido a me aceitar pelo que eu sou).
   Pois bem... caminhando por essas novas conscientizações, eu hoje deixei de lado a ideia de que o teatro é algo imprescindível para a construção do ser, para a revolução pessoal ou reforma íntima. Cada um tem o seu caminho. Qual teria sido o meu se eu tivesse tido espaço para me expressar do meu jeito, com a minha identidade? Será que eu teria feito teatro para poder dar voz à minha alma?
   Seja como for, neste momento eu recorro ao poetinha Fernando Pessoa, que questiona e responde:
 “Valeu a pena?
Tudo vale a pena,
quando a alma não é pequena.”








P.S.: Sabe que pensando bem, esse negócio de que “tudo vale a pena” é um grandessíssimo de um paliativo pra amenizar a dor perante as coisas vãs que a gente faz na vida... ou não?

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

A Crítica e a Verdade


Moema Ameom

No último trabalho de Preparação Corporal com o grupo de bailarinos da montagem Orfeu, falei sobre a importância de se estar seguro nas expressões internas para que a arte possa ser vivida plenamente. Agradar a si próprio antes de imaginar ser capaz de agradar ao próximo. Extrair das ações / reações provenientes dos movimentos vitais inerentes à representação artística, a verdade nelas inseridas pelas emoções. Conscientizá-las no corpo para ser capaz de conviver com os desequilíbrios que trazem a fim de podermos encontrar o equilíbrio psicossomático.

Ainda reverenciando minha avó, transcrevo trechos de críticas que exemplificam o que coloquei em nosso encontro.

A estréia de Céo da Câmara – [...] ou a Sra. Céo da Câmara é uma dissimulada, ou então os graves defeitos de sua educação artística, são daqueles que não se corrijem mais [...] Se uma vocação artística como a Sra. Céo da Câmara, depois de retocada pelo Conservatório de Múzica e pela Escola Dramática, assim se aprezenta cheia dos mais graves defeitos, é que essas duas falharam por completo para os fins a que se destinam. [...] – Coluna “Pelos Teatros pelos Cinemas” assinada por Zando - Jornal A Folha em 19/3/1920

Em resposta minha avó escreveu:

“Ilmo. Sr. Redator de “A Folha” – Rio – acabo de ler no seu conceituado jornal de hoje, uma crítica, antecipada, sobre meus méritos de artista dramática e cantora. Enquanto ao valor da minha individualidade artística, nada direi, pois a crítica, sincera ou não, é sempre livre, mesmo quando Ella, como agora, é antecipada; porém, enquanto ás apreciações do Sr. Zando sobre a Escola Dramática e o Instituto Nacional de Música, não posso nem devo silenciar, razão por que lhe scientifico que não tenho curso da Escola Dramática, que freqüentei apenas 2 anos e que nunca freqüentei siquer o Instituto Nacional de Música. O pouco ou quase nada que sei de canto, estudei-o com a grande artista e conhecida professora Mme. Stinco Palermini. [...] De V.Ex. com muita consideração, Céo da Câmara, atriz, cantora e brasileira. – 20/3/1920

No dia da estréia a crítica que saiu no Jornal do Brasil dizia:

[...] Fallemos da estreante Céo da Câmara que, aos 17 anos e pela primeira vez que pisa o palco teve que arcar com a responsabilidade de um grande e difícil papel. [...] A sra. Céo da Câmara tem realmente muito valor. Se não fora isso hontem ter-se-ia registrado um grande desastre, de que talvez nunca mais deixasse de sofrer as conseqüências. [...] Possue a estreante, como sua maior qualidade, a faculdade de emocionar-se e transmitir a emoção, qualquer que ella seja. É, em synthese, uma actriz não porque tenha aprendidp a ser, mas por vocação natural, innata[...].”-M.N.

A peça em questão era A Estrela D’Alva – opereta em dois atos do Dr. Mario Monteiro música de Francisca Gonzaga, encenada no Teatro Recreio – RJ. A personagem (central) – moleirinha Rozinha

Será que realmente conseguiu não sofrer as conseqüências deste fato? O esforço causado pelo seu corpo, onde a hipotonicidade predominava, para suportar a potência da verdade existente em seu coração, certamente a fez guardar sensações muito desagradáveis em sua cognição. Estes processos estressantes causaram-lhe desestruturas psicossomáticas tão intensas que acabaram por lhe acarretar sérias doenças.

Pela minha experiência como pessoa / profissional, posso testemunhar que, quando o Sistema não se encontra em equilíbrio dentro das ondas emocionais, o resultado conduz sempre para a inconsciência dos fatos, a sublimação das emoções e ao fortalecimento do Corpo Etéreo em detrimento da utilização do Corpo Físico como instrumento da potência vital revitalizada constantemente pelo Corpo Ósseo. Sendo o CF o responsável pela saúde do Sistema, será sempre nele que a harmonização ganhará um padrão vibracional de qualidade onde o ajuste tonal gera harmonia e paz.

Mais uma vez ressalto que mantive a identidade ortográfica dos textos extraídos do Album no.1 que meu avô Annibal fez com recortes da trajetória artística de minha avó.

Todo o material foi cedido em 2010 para o Sr. Leonardo Simões que com eles construiu sua tese de mestrado na UNIRIO com o título “Céo da Câmara – o relicário de uma atriz da primeira metade do século XX.”

“A imagem de Céo é refletida em três aspectos que se entrelaçam em sua existência, e que sobressaem dos álbuns como três relações intensamente amorosas: com a Família; com a Arte; e com a Pátria.” – L.B.

Par quem quiser saber mais sobre minha querida avó: http://www.seer.unirio.br/index.php/pesqcenicas/article/viewFile/736/673

Celebração


Moema Ameom

Celebro na essência esta relação eternamente amorosa que compartilho com minha avó materna Céo da Câmara de cuja convivência extraio belos aprendizados assimilados até a idade dos 13 anos quando ela deixou a matéria.

Transcrevo um texto escrito por ela para o Jornal O Município – Rio Preto, 29/12/1926, com o pseudônimo de CECY.

Deixando o Word enlouquecido, mantive a ortografia da época, para distrair os olhares.

Folhinhas ...

[...] Os seus calendários, para mim, são como outros tantos saccos de “papá Noel”, cheios de brinquedos e de surprezas... nelles guardo todos os meus desejos, como se fossem pequenos “bon-boms” assucarados em caixinhas de setim...

Folhinhas ... Na variedade dos seus chromos eu vejo como que um vago reflexo da variedade dos dias: hoje um riso que se desfaz em expansões de alegria, amanhã uma lágrima que se insinua e passa.

Folhinhas ... No silêncio caricioso de minha sala, volitando o olhar pelas lindas folhinhas novas, às vezes eu sinto saudades ... saudades das folhinhas velhas ...”

No meu caso, vó, saudades que me trazem muitas alegrias porque me conduzem a um período onde minha alma tinha acolhida por ser compreendida plenamente.

ReVIVO-as!!

O Termo


Moema Ameom

Segundo a Enciclopédia Britannica, a palavra teatro deriva do grego theaomai (θεάομαι) - olhar com atenção, perceber, contemplar (1990, vol. 28:515). Theaomai não significa ver no sentido comum, mas sim ter uma experiência intensa, envolvente, meditativa, inquiridora, a fim de descobrir o significado mais profundo; uma cuidadosa e deliberada visão que interpreta seu objeto (Theological Dictionary of the New Testament vol.5:pg.315,706)

O teatro, mais do que ser um local público onde se vê, é o lugar condensado das ambigüidades e paradoxos, onde as coisas são tomadas em mais de um sentido. http://pt.wikipedia.org/wiki/Teatro#O_termo_teatro_e_seus_significados

A arte em seu contexto mais amplo não produz sentido comum. Não deixa que a vida se mediocrise nem minimize sua potência. Instiga a mente, motiva sensações e conduz a imaginação para além das fronteiras do possível. Artista é aquele (a) que transcende à forma seja do corpo ou da idéia. Ousa, arrisca e assume a presença de muitas vidas em sua existência. Permite que penetre em seu corpo expressões que não são suas. Apropria-se de emoções que não lhe pertencem. Mergulha em universos paralelos saídos das palavras de um script ou roteiro. O Teatro é o templo sagrado onde estes seres especiais por excelência, expõem suas vertentes de visceral emoção.

Todos os seres humanos trazem in.si esta capacidade artística de transformar e recriar sensações. Por que usá-la apenas no espaço designado como palco? Não será a própria vida um imenso teatro?

Melodrama


por Moema Ameom

“Em vinte anos, Tautin foi apunhalado 16.302 vezes. Mary foi preso 11.000 vezes. Mademoiselle Dupuis Foi 75 000 vezes seduzida, raptada ou afogada”... No Século XIX, era isso que tinham de suportar os atores durante os melodramas (*), que levavam ao palco histórias terríveis que encantavam o grande público. Na sala de espetáculos, os espectadores se desfaziam em lágrimas, maldiziam os perversos ou morriam de medo! Esse gênero teatral, desprezado pelos amantes do teatro clássico, fascinou alguns jovens autores, como Victor Hugo, Alexandre Dumas, Alfred de Musset. Assim nasceu o romântico, que igualmente provocou um escândalo: algumas apresentações terminavam em pancadaria.

Fonte: texto extraído do livro “O Teatro no Mundo” Editora Melhoramentos, pag.22

Quais os atrativos do drama? Por que a humanidade prioriza esta sensação?Será devido aos estímulos mais intensos que ela produz no organismo? Ou será devido ao vício adquirido pelo Corpo Físico de funcionar embebido em adrenalina?

Seja lá como ou porque seja, o fato é que as sensações de prazer só surtem efeito quando surgem depois de muito estresse. Caso contrário felicidade, alegria, prazer parece ter um gosto insípto para a grande maioria dos seres humanos. Primeiro cultiva-se a dor, a doença, o mal estar, a irritação; leva-se o organismo aos píncaros do limite para depois buscar o caminho do deságüe, da solução, da tranqüilidade e da paz. A endorfina, acompanhada da serotonina e oxitocina, não causam sensações espetaculares. Não crescem a audiência. Não dão IBOPE.

Curiosidades aparte acredito que a educação, ou a história percorrida, tenha levado o melodrama a fazer mais sucesso ganhado mais aplausos da sociedade. Acostumou-se a ver sofrimento como diversão. Hoje, não mais em praça pública, mas acomodado dentro de casa, o público busca seu sofrimento diário diante da TV. Seja no Tele Jornal, na dramaturgia novelesca, nos desenhos animados, nos filmes em série, o sofrimento conduz os humanos a ondas emocionais que desanuviam as tensões do dia a dia. Ou seja, intensifica-se a tensão para que o estresse possa transformar-se em fluxo vital. O mais grave nesta brincadeira de mau gosto é que os Sistemas viciam-se de tal forma neste jogo desvitalizante que perdem a consciência de sua sabedoria interna, autônoma feita para construir uma vida prazerosa. Produz-se guerra em nome da paz.

Estamos necessitando de novos dramaturgos capazes de mostrar ao grande público um novo caminho de ilusão, caso contrário, daqui a pouco, bem pouco tempo, não teremos mais nem platéia para aplaudir os (in)sucessos. Nem mesmo poderemos manter esta cultura de Século XIX acreditando que estamos evoluindo.

Que tal deixarmos de olhar para nossa cultura regional como sendo de pouca importância? Nossos índios, há séculos, denominavam este território, hoje brasileiro, de “Pindorama – terra sem males”. Enquanto na Europa o sucesso era o melodrama, aqui as danças, os cânticos, as brincadeiras, ganhavam muitos aplausos.

Que tal ReConhecermos este caminho como sendo nosso?

(*) Drama popular originado das confusões da Revolução Francesa e das guerras.